A partir daqui, no blog agora rebatizado de "Narrativas em Duas Rodas" (antes Brasil-Peru em Duas Rodas), passo a relatar as minhas viagens não mais com a XTZ 125, mas com a Lander 250. Estes relatos tiveram início em fevereiro de 2015.
A morte é uma noiva
Primeiro Trecho
(Cruzeiro do Sul-Rio Branco)
A viagem teve início pela BR 364 em Cruzeiro do Sul. Para um
viajante que inicia seu trajeto pelo ponto extremo noroeste do Brasil em
direção ao sudeste, a sensação será de que as rodovias melhoram gradativamente
a medida em que se aproximam de São Paulo.
Minha percepção da rodovia, em fevereiro, por aquilo que
venho acompanhando na imprensa do estado, certamente expirou e as condições da BR
parecem ter piorado bastante desde então. Mas, mesmo naquela época, já era
possível afirmar que este trecho da BR 364 apresenta as piores condições de
trafegabilidade de todo o trajeto. Contudo gosto de fazer a ressalva que este
não é o trecho mais perigoso. Mais adiante irei descrever algumas situações
pela qual passei em regiões de tráfego intenso de caminhões.
A rodovia obriga o condutor a manter na maior parte do
trajeto, uma velocidade compatível com a segurança, que no meu caso variava
entre 70 e 85 km/h em média. Com exceção dos dois trechos consolidados
(Juruá-Liberdade e Sena Madureira-Rio Branco), onde é possível manter uma
velocidade maior, acima disso é flertar com a morte.
Segundo trecho Rio
Branco- Porto Velho (550Km)
A BR 364 segue em bom estado a partir da saída de Rio
Branco, e contrariando minhas expectativas, piorou consideravelmente a partir
da divisa com Rondônia.
É necessário realizar a travessia do rio Madeira de balsa, o
que acrescenta cerca de 30 minutos à viagem.
A travessia é paga e o pagamento
deve ser feito em um guichê, antes de se adentrar à balsa.
A partir da travessia, a qualidade da pista melhora
sensivelmente. Este foi justamente o trecho mais danificado pelas alagações do
ano de 2014, que isolaram o estado do Acre do restante do país. Ainda não foi
totalmente refeito, e sempre há o risco que novas alagações venham a cobrir
novamente a pista.
Por muitos quilômetros é possível perceber a marca da linha d’água
da última alagação nas árvores ao redor. Fico de pé no estribo de minha moto e
esta marca atinge a altura do meu peito.
Chego ao município de Jaci-Paraná ao anoitecer. Está caindo
uma chuva fraca e decido seguir em frente, afinal, são apenas 88 km que me
separam de Porto Velho.
Cerca de dez ou quinze minutos depois na estrada a chuva
torna-se torrencial e a noite toma conta da estrada. Penso que está tudo bem,
afinal, tenho uma jaqueta para me proteger e o farol ilumina à frente. Mesmo
encharcado, sigo adiante mais alguns quilômetros. Aparece a primeira curva, e o
caminhão que vem no sentido contrário me deixa completamente “encandeado”.
Percebo que com a chuva e a escuridão, não é mais possível determinar a
trajetória dos veículos que vem no sentido contrário. Risco de colisão frontal ou
de sair da pista. Meu instinto de preservação fala mais alto. Dou a meia volta
em direção à Jaci-Paraná. Lá encontro uma hospedagem. Acerto minha diária e
retiro a bagagem da moto.
Encharcado, percorro a sala e o corredor em direção ao
apartamento. Gelado, retiro minhas roupas e ligo o chuveiro quente. Meu corpo
está tenso. É o medo. Fecho os olhos água debaixo da água quente e à medida que
meu corpo relaxa, vejo que a morte estava me esperando, tal qual noiva ansiosa,
a duas curvas adiante de onde voltei.
A deixo esperando no altar.
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